PENTECOSTE
O fogo que não se apaga
O dr. John Stott,
considerado um dos maiores exegetas bíblicos do século XX, disse que
"antes de mandar a igreja para o mundo, Cristo mandou o Espírito para a
igreja. A mesma ordem precisa ser observada hoje". Não há missão sem
capacitação. Não há pregação sem poder. Não há avivamento sem derramamento do
Espírito.
Leonard Havenhill, em
seu livro Por que Tarda o Pleno Avivamento?, conta a experiência de um
pastor que pregou uma tabuleta na porta da sua igreja: "Esta igreja
passará por um avivamento ou por um sepultamento". Visitei na Europa, nos
Estados Unidos e no Canadá muitas igrejas históricas que tiveram um passado
cheio de vigor e hoje são consideradas igrejas mortas. Têm templo, têm
orçamento, têm estrutura, mas não têm vida.
Mas é possível a
igreja experimentar hoje um novo derramamento do Espírito Santo? Precisamos,
de início, entender que o Pentecoste no seu sentido pleno é irrepetível. O
Espírito Santo foi derramado para permanecer para sempre com a igreja. Ele é o
outro Consolador que estará para sempre conosco. Agora, todos os outros
avivamentos decorrem daquele que aconteceu em Jerusalém nos primeiros tempos.
Nesse sentido, não há mais Pentecoste. Todavia, a promessa de novos
derramamentos do Espírito para despertar a igreja é uma promessa viva à qual
devemos agarrar-nos. É nesse sentido que vamos usar o termo Pentecoste. O
apóstolo Pedro disse naquele dia memorável: "... e recebereis o dom do
Espírito Santo. Pois para vós outros é a promessa, para vossos filhos e para
todos os que ainda estão longe, isto é, para quantos o Senhor nosso Deus
chamar" (At 2.38-39).
Ao longo da
história, Deus visitou o seu povo, irrompendo com grande poder e trazendo à
igreja tempos de refrigério, através do derramamento do seu Espírito. Foi
assim entre os valdenses, na França, no século XII. Foi assim na Reforma do
século XVI, quando o Espírito de Deus soprou com grande poder na Europa,
usando homens como Lutero, Zwinglio, Knox e Calvino. Deus voltou a visitar a
igreja com grande poder no século XVII, levantando sobretudo na Inglaterra os
puritanos, uma das gerações mais santas e cultas da história da igreja. No
século XVIII, as janelas dos céus se abriram em copioso derramamento do
Espírito na Inglaterra, no País de Gales e na Nova Inglaterra. No século XIX,
Deus enviou a chuva torrencial do seu Espírito em grandes avivamentos nos
Estados Unidos, na Escócia, na Inglaterra e na Irlanda do Norte. No século XX,
Deus tem feito maravilhas, desde o grande avivamento do País de Gales, em 1904,
com Evan Roberts; o grande avivamento nas Ilhas Novas Hébridas, em 1946, com
Duncan Campbell; o avivamento entre os zulus, na África do Sul, em 1966, com
Erlo Stegen; e o grande despertamento na Coréia do Sul, desde 1907, quando o
vento do Espírito começou a soprar com grande poder, levando aquela igreja a
um colossal crescimento até os dias de hoje.
Temos base,
portanto, para buscar e esperar um Pentecoste, ou seja, um derramamento do
Espírito nestes dias.
Por
que o pentecoste é necessário hoje?
1. Por causa do baixo nível espiritual do povo de Deus
A igreja via de regra tem crescido para os
lados, mas não para cima nem em profundidade. Ela tem sido muitas vezes
superficial, rasa, imatura e mundana. Tem extensão, mas não profundidade. Tem
números, mas não vida. É grande, mas não causa impacto. Ela cresce, mas não
amadurece. Tem quantidade, mas não qualidade. É como a igreja de Sardes: tem
nome de que vive, mas está morta (Ap 3.1). Há um vácuo, um hiato, um abismo
entre o que os crentes professam e o que vivem, entre o que falam e o que
fazem. A integridade e a santidade não têm sido mais o apanágio da vida de
muitos crentes. Eles estão caindo nos mesmos pecados vis que condenam nos
ímpios.
Não raro, a igreja é
mais comentada hoje por seus escândalos do que pelo impacto de seu
inconformismo com o mundo. A maioria dos cristãos adota um cristianismo
desfigurado, no qual a verdade é ultrajada, a Palavra é relativizada e os
valores absolutos de Deus são pisoteados. O Evangelho que muitos pregam hoje é
um sincretismo semi-pagão. Estamos assistindo à comercialização indiscriminada
e descarada do sagrado. Muitos pregadores abraçaram um semi-Evangelho, um
Evangelho sem cruz, sem verdade, sem absolutos. Esses pregoeiros não se
importam com a verdade, estão mais interessados no lucro. Não buscam o que é
certo, mas o que dá certo. Não buscam o que é ético, mas o que funciona. Essa
atitude inconseqüente de pregar um evangelho misturado com heresias, para
satisfazer a ganância insaciável do lucro fácil, tem gerado crentes fracos,
doentes e superficiais, e causado mais escândalo que impacto positivo na sociedade.
A igreja perdeu sua vez e sua voz. Ela se impõe não pela força espiritual, mas
pelo seu potencial de barganha. Ela perdeu a autoridade para falar em nome de
Deus, pois o evangelho que ela prega é outro evangelho. Estamos vivendo o
doloroso período de uma igreja apóstata. Vibrante, sim; mas, sem a vida de
Deus. Rica, sim, diante dos homens; mas, diante de Deus, pobre, cega e nua.
Quando a sã teologia
é abandonada, a conduta entra em colapso. A teologia é mãe da ética. A
teologia determina a ética. O homem é resultado da sua fé. Como ele crê no seu
coração, assim ele é. Antes da vida vem a doutrina. A doutrina determina a
qualidade de vida. Não há santidade fora da verdade. Não há cristianismo
autêntico se na sua base não está a Palavra de Deus. Uma igreja apóstata não
pode gerar crentes genuínos. Uma igreja em crise espiritual gera crentes
trôpegos e doentes.
Estamos vendo, por
isso, que a cada dia o mundo está entrando mais para dentro da igreja. A igreja
tem mais assimilado que influenciado o mundo. Ela se conforma mais com o mundo
do que produz nele impacto. A glória de Deus não está mais sobre a tenda da
igreja. A igreja se contorce com as dores de parto para dar à luz a seu filho
Icabode. O brilho do
rosto de Deus não mais tem resplandecido na vida da igreja, que perdeu a sede
de Deus para buscar avidamente as bênçãos de Deus. Deus se tornou para ela
apenas um abençoador, e não o Senhor. O homem é o centro, e não Deus. O que se
busca é que a vontade do homem se faça no céu, e não que a vontade de Deus se
estabeleça na terra. O homem hoje busca não a face de Deus, mas o lucro. Ele
vai à igreja não para adorar, para oferecer algo a Deus, mas para buscar uma
bênção. A sua lei é a da sanguessuga: me dá, me dá. O homem invoca a Deus não
porque tem sede de Deus, mas por aquilo que pode dele receber. Ele entrega o
dízimo não porque tem prazer na fidelidade, mas pelo retorno que isso pode
representar. O homem assim serve não a Deus, mas a Mamon.
Há também aqueles
que, à semelhança dos crentes de Efeso, são ortodoxos, mas perderam o calor
espiritual, abandonaram o primeiro amor. Guardam doutrinas certas na cabeça,
mas são gelados na vida espiritual. São ortodoxos de cabeça e hereges de
conduta. São zelosos em observar os rituais, mas condescendentes ao pecado. São
observadores externos dos preceitos de Deus, mas cheios de podridão por dentro.
Vão à igreja, mas não entram na presença de Deus. Cantam hinos, mas não adoram
a Deus. Fazem longas orações, mas desconhecem a glória de entrar no Santo dos
Santos da intimidade com o Senhor. Jejuam, mas não se humilham na presença do
Todo-poderoso. Não têm temor de Deus no coração. Acostumaram-se com o sagrado,
já não sentem mais deleite na Palavra nem alegria na vida de oração, perderam
a visão da obra de Deus, por isso já não têm mais paixão pelas almas. Vivem um
cristianismo árido, estéril, apenas de fachada e aparência.
A conseqüência
natural dessa fé trôpega é uma vida mundana, imiscuída com o pecado,
mancomunada com o que é vil. Os crentes de hoje, não raro, são pouco diferentes
das pessoas do mundo: o namoro é igualmente licencioso e lascivo, os negócios
são igualmente enrolados. Falta integridade nos compromissos e verdade nas palavras.
Há crentes que são cativos de vícios degradantes e, para manter as aparências,
colocam máscaras e cometem assim duplo erro: o de pecar e o de tentar esconder
o pecado. A qualidade da vida moral do povo evangélico hoje está muito aquém
daquilo que Deus estabelece em sua Palavra. Não adianta racionalizar, criando
motivos para justificar o pecado. Deus pesa os corações. Ele sonda os filhos
dos homens. Diante dele a luz e as trevas são a mesma coisa. Ninguém escapa
do escrutínio de Deus. Seus olhos oniscientes devassam todas as máscaras que
usamos. Diante de Deus não adianta disfarçar. Ele requer a verdade no íntimo.
Ele não se satisfaz com a aparência. Ele não se contenta com folhas; Ele busca
os frutos.
Antes de falar do
derramamento do espírito, o profeta Joel convocou a nação de Israel a se
voltar para Deus. Antes do Pentecoste, o pecado precisa ser tratado. Antes de
os céus se abrirem, o povo precisa acertar sua vida com Deus. Antes do
derramamento do Espírito, o caminho para Deus precisa ser preparado. E Joel
(2.12-16, 28) diz que essa volta precisa ser: a) profunda - ou seja, de
todo o coração. Não adianta fingir. Não adianta tocar trombeta. Deus não se
impressiona com a majestade dos nossos gestos e com a eloqüência das nossas
palavras. Ele não aceita promessas vazias, votos tolos, compromissos pela
metade; b) com quebrantamento - ou seja, com lágrimas e pranto. Deus
não despreza o coração quebrantado. As lágrimas de arrependimento não são
esquecidas por Deus. Os que choram por seus pecados são bem-aventurados. É
impossível ser cheio do Espírito sem antes esvaziar-se de todo o entulho que
entope a nossa vida. Essa faxina é dolorosa, mas precisa ser feita, ainda que
com lágrimas; c) com diligência - ou seja, com jejum. Precisamos
jejuar para que Deus dobre o nosso coração e o torne sensível. Precisamos
jejuar para que Deus nos dê percepção da malignidade do nosso pecado e da
pureza da santidade divina. Precisamos jejuar para que todas as desculpas que
arranjamos para não nos voltarmos a Deus caiam por terra; d) com
sinceridade - ou seja, rasgando o nosso coração. No passado, as pessoas
tinham o hábito de rasgar as vestes na hora do desespero. Deus, contudo, não
se contenta com atos exteriores. Ele não se satisfaz com teatralização. Diante
dele não adianta empostar a voz, gritar, gesticular, pois esses gestos não o
impressionam. Ele quer um coração rasgado, sincero, autêntico, determinado a
voltar-se para ele. Quando a trombeta soou, o povo foi convocado a voltar-se
para Deus, do sacerdote à criança de peito, e houve restauração e perdão. Como
resultado, veio a gloriosa promessa: "... e acontecerá depois que derramarei
o meu Espírito sobre toda a carne" (Jl 2.28). Veja que o derramamento do
Espírito vem depois e não antes do acerto de vida com Deus. Buscar avivamento
sem antes tratar do pecado é leviandade, pois é querer que Deus compactue com o
erro. É preciso preparar o caminho para que Deus se manifeste.
Hoje, tristemente,
precisamos admitir que a igreja está doente e fraca por causa do pecado. Falta
vida aos cultos. Onde não há sinceridade, não há adoração digna de Deus. Onde
não há santidade, não há comunhão com Deus. Deus estava cansado do culto do
povo de Judá, porque as mãos do povo estavam cheias de sangue. Eles multiplicavam
suas orações na mesma medida que aumentavam suas transgressões (Is 1.15). O
profeta Amos chegou a dizer que Deus estava cansado de ouvir as músicas
religiosas do seu povo e não suportava mais o tanger de seus instrumentos (Am
5.23), porque o povo tinha culto, mas não tinha vida. O profeta Malaquias vai
mais longe ao falar em nome de Deus, recomendando que se fechasse a porta da
igreja, a fim de que as pessoas não acendessem o fogo no altar inutilmente (Ml
1.10). Isso porque elas estavam desonrando a Deus e colocando no seu altar
animais doentes, cegos, dilacerados, ou seja, o resto, a sobra, não as primícias.
Há hoje muitos cultos frios, cadavéricos, sem pulsação, sem o latejar da vida.
Há outros cultos que, caindo para o extremo oposto, são uma apresentação
teatral, um show, no qual as pessoas prestam um culto do homem para o homem. O
que conta é o desempenho e o poder de manipulação de massa do dirigente. Há
ocasiões em que o culto se torna um balcão de negócios onde se comercializa o
sagrado, onde se loteia o céu e se vende a graça de Deus por dinheiro, onde se
fala em nome de Deus e se fazem promessas em nome de Deus que ele nunca fez em
sua Palavra. Sim, tudo isso mostra o baixo nível espiritual do povo de Deus e
impõe para nós a necessidade imperativa de um Pentecoste!
Fonte:Hernandes Dias Lopes